HOJE, SIM: PRISMA QUASE CALEIDOSCÓPIO
Oreste, pensando bem, você tem cara de sino.
Oreste ― alma de sino ―
Belelém-dlin-dlon:
um sino de planície
chamando ― alma de sino ― a increntes de montanha.
Oreste sempre crendo
no minuto seguinte d'êxtase",
"ordeiro, reto, justo e generoso
sois".
Cara de sino.
Oreste a
noroeste.
Nororeste a oeste
Leste, deste
lenta suavidade ao sonho,
ao agonizante esquema,
ao roto sistemalismo ancião.
Ancião mesmo.
Alma de garoto.
Vento ventando na dimensão do sonho
e tirando ramelas dos olhos da manhã.
Buscar um mundo.
Oreste buscas um mundo.
Oreste, que tambor aciona o teu
cansaço?
Alma de gato-miau &
tal em sete esperas.
Foi de manhã o ocaso, por acaso, de meu
choro
e do meu inverno.
E, de teu inverno (como Kafka)
erigiste a plataforma.
Encontro de almas anciãs:
Oreste Maurizio e Marcos Resende.
Podia e deve só rimar com:
teu coração de criança entende.
Mas hoje a tua messe é farta,
consola-te,
e alta inclui a lua
um braço em tua vereda.
Gratia plena.
Fé morena.
"O inesperado fez uma
surpresa".
E tua represa,
de tanta alma de leão-rompante rompeu
a barragem de tua apenas erudição.
Criação, Oreste, fez-se-te num repente
e agora, arca com tua responsabilidade.
Poesia.
Oreste,
Ore$te,
mas, principalmente, Aureste
sempre predisposto a fechar a cara
"ao engraçadíssimo abismo
turbulento".
Às vezes (sempre) com ar severo,
zangado;
descontente com todos, de todos ―
A cara fechada: "Heil,
Hitler!"
"Wunderbar" ― "I'm
Genius!".
E aquele vasto ar de descontentamento.
Bravo de araque, desembestou
no declive de poetar.
Poetaste, poetas ― lança de
esperança,
tu lanças de esperança.
"Tão preciso acordar da morte em
vida".
Um dia te encontrei, Oreste,
"penetrando surdamente no reino
das palavras".
O público do Rio.
As velhas corocas.
Dona Alda pra cá, dona Alda pra lá...
― Uma boa parelha de coices no rabo de
don'Alda!
Um dia te encontrei no rio Rio.
Barolli: "Quem diria?";
Otacílio e seu bifendido cavanhaque.
Ari, sutil, cozinheiro e sempre
infância,
sempre mãe. Seguro em caos de pratos
sujos.
Silvinho, violão, voz, tomates cruz,
pão sem manteiga,
telefone, Sônia, Glória, bocetas
esperando pau.
Almas procurando amor, só amor.
Bocetas sem rapé e o Conselheiro
Acácio.
Picasso ― véu de azul.
Verão à beira-mar,
ricaços em Bariloche.
Batatas, agora definitivamente com sal,
perto do mar.
Mas, tu tens alma de sino
e pode nos contar de estórias de
abandono.
Ainda te resta um par de olhos
bons,
coração não foi arrancado, és idealista.
Pernas, pena, e toda uma sacada
para, do teu jeito, documentares a
vida.
Resta-te um prisma, um ângulo só teu
e a mão direita, caneta obediente.
Delelém-dlin-dlon.
Não valeu a pena o choro de Maria.
Mara, há já bom tempo, se esfumou por
nada.
De Vera e de Maria nem restou escrita,
escuta.
Caramujo tempo o que hoje vivo agora.
Ainda sobrevive-te um pouco de
cordeiro, Oreste manso.
Crença, carne e osso; depois do almoço,
outra visita ao Rio.
Nem foi abraço os braços corcovados
de um Cristo que, há muito,
Maria deixou chorando.
Mas hoje, riso, Oreste ―
alma-de-domingo-sino
Dém dém dém dém dém dém dém dém dém.
Peito estufado ― Argemiro.
Não e não e nunca esqueças a que foste.
Volta tua mão e cumprimenta o Cristo,
só em seu destino,
com aquele olho seco dissecando a
noite.
Escuta.
São Paulo Junho 1969