O silêncio tiraniza a noite,
prende a noite ― e é preciso
mudá-lo
num
canto que desperte, enterneça, anime.
Tão preciso acordar da morte em vida.
Nesta cidade, o desespero range como um
sino velho,
e alguém está desperto ainda. Nem tudo
está perdido.
Há o escritório cedo, o pão de cada
dia.
Mas, a lua pede, o coração sugere
e a madrugada obriga.
Amadas adormecidas, despetalando
sonhos,
adivinhando o amado envolto na neblina,
bordam flores de fogo,
no mistério das lareiras,
na magia das fogueiras,
na chama das lamparinas.
Parece que a menina entorpecida em
pluma,
gravita, embaralhada, no torpor da
espera.
Prevê a serenata na ambição do sonho.
Espreita, na surdina,
e ― na cortina ― espera.
Os passos na calçada. A voz varando o
vento.
Coração galopa de esperança acesa.
Relâmpago no olhar enluarando a rua.
E seu olhar é lua. Lampião de estrela.
O apito da polícia brutaliza a noite,
fere e sangra a noite,
dilacera o dia.
E é preciso liberar o canto proibido.
Britar ― é preciso ― o
coração de asfalto,
os punhos de aço, o cérebro encapado
de quem proíbe a lira ostentando a
lança.
Fuga. Violão quebrado. Talvez, quarto
com grades.
Mas, as pernas quando correm, enganam o
rastejar
canino farejando música. Fogem.
Soco na cara. O seresteiro cede.
No violão caído, um pranto dissonante.
E dorme a cidade. Sono. Indiferença.
Tão preciso acordar. A madrugada exige.
Varginha 1968