POEMA DAS IDAS E VIDAS


Bondes indo.
Bondes vindo.

Carros vindo.
Carros indo.

Mundo lindo!

Maria Zero.
Morreu marido,
Morreu menino,
morreram à míngua.
E ao nascer outro,
que nasceu morto,
Maria Zero
morreu, também.

Bondes indo.
Bondes vindo.
Gente vindo.
Gente indo.

Mundo lindo!

Casa sombria,
casa quieta,
casa calma,
casa cheirando
o cheiro que cheirariam
assombrações maníaco-reumáticas,
caso cheirassem.

Baratas indo.
Fantasmas vindo.

Só a casa não ia nem vinha.
Casa besta.
Casa original.

Casa linda!
Baratas lindas!
Fantasmas lindos!
Mundo lindo!

Sábado-noite.

Homens indo.
Mulheres vindo.

Homens e mulheres andando à toa,
como quem nada quer,
mas querendo tudo.

Mulheres indo.
Homens indo.

Domingo-cedo;
Dia com cara de domingo como todos os outros,
enfeitado com hinos e liturgias.

Beatas indo.
Padres vindo.

Sacristãos nervosos
berram raivosos
com coroinhas,
que, temerosos,
tremem chorosos,
em ladainhas.
Amééééém!

Dia-todo
todo dia
bondes vindo
carros indo
homens indo
padres indo
vida indo
vida vindo.
Todo dia
mundo lindo!

Lindo, merda!     
Linda merda!
Lindo, nada!
Todo dia,
mundo fútil
mundo inútil!
Porcaria!
                                                                                  São Paulo 1966


© 2022 Marcos Resende
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