RODA DA FORTUNA
A felicidade completa, aqui neste planeta de inveja e desolação, tem a grande desvantagem de atrair... a completa infelicidade. E esta, chega do dia para a noite. Quando tudo corre às mil maravilhas, inopinadamente paira uma névoa pestilenta no campo magnético da vítima, e na rapidez característica das desgraças, vai esparramando miasmas venenosos da adversidade ― prelúdio da bancarrota, da humilhação, do infortúnio.
É um caminho sem volta; mas, há quem acredite em caminho que leva e traz ― e assim é, porque quando o infeliz, ferido de morte, queda-se a menos de um milímetro do auge do desespero, se tiver que vir, o socorro virá ― a infelicidade, que era absoluta, cede lugar ao antídoto capaz de manipular o destino ― e não raras vezes, do inferno, subitamente, faz-se o paraíso.
A essa inquietação permanente dá-se o nome de Roda da Fortuna, mil vezes temida pela sina de, sem interrupção, girar, e friamente ditar felicidade ou desdita: hoje, eu; amanhã, você. Hoje, o poder; amanhã, a indigência. Hoje, o sublime milagre do amor correspondido; amanhã, a crueldade da perda, a crueza do coração repelido, uma pavorosa solidão.
Em suma, nada é duradouro
e tudo é possível, quando a Roda se intromete e gira. E se acaso lhe apraz,
movida não importa por que motivo, frívolo ou divino, a Roda vira pelo
avesso a adversidade, e restitui a Fortuna confiscada ― em plenitude e exuberância maiores do
que nunca.
Pois é assim, mas, talvez não seja. Que ouça quem puder, e não se meta a interferir, posto que a isenção é atributo dos sábios e aquilo que ainda não é, será; e todavia não será, mas será e não será aquilo que vai ser.
São Paulo 2014